sábado, 30 de janeiro de 2010

Derek Walcott (1930-2017)

FAR CRY FROM AFRICA
Derek Walcott

A wind is ruffling the tawny pelt
Of Africa, Kikuyu, quick as flies,
Batten upon the bloodstreams of the veldt.
Corpses are scattered through a paradise.
Only the worm, colonel of carrion, cries:
"Waste no compassion on these separate dead!"
Statistics justify and scholars seize
The salients of colonial policy.
What is that to the white child hacked in bed?
To savages, expendable as Jews?
Threshed out by beaters, the long rushes break
In a white dust of ibises whose cries
Have wheeled since civilizations dawn
From the parched river or beast-teeming plain.
The violence of beast on beast is read
As natural law, but upright man
Seeks his divinity by inflicting pain.
Delirious as these worried beasts, his wars
Dance to the tightened carcass of a drum,
While he calls courage still that native dread
Of the white peace contracted by the dead.

Again brutish necessity wipes its hands
Upon the napkin of a dirty cause, again
A waste of our compassion, as with Spain,
The gorilla wrestles with the superman.
I who am poisoned with the blood of both,
Where shall I turn, divided to the vein?
I who have cursed
The drunken officer of British rule, how choose
Between this Africa and the English tongue I love?
Betray them both, or give back what they give?
How can I face such slaughter and be cool?
How can I turn from Africa and live?

UM GRITO DISTANTE DA ÁFRICA
Derek Walcott

Um vento brame o escuro tambor
da África, dos Kikuyu, rápido como moscas,
que vivem nas veias que cortam os campos..
Cadáveres se espalham pelo paraíso.
Apenas o verme, nos restos mortais, exclama:
– Não se compadeçam destes infelizes!
As estatísticas justificam e os especialistas se agarram
aos aspectos da política colonialista.
O que é isto para a criança branca mutilada em sua cama?
Para os selvagens, desprezados como os judeus?
Flagelada por batedores, os longos ataques rompem
em brancas nuvens de íbis, cujos gritos
reverberam desde os primórdios das civilizações
do rio seco ou das planícies repletas de animais.
A violência entre animais é vista
como lei natural, mas o homem ereto
busca a divindade infligindo a dor.
Loucos como animais horrendos, suas guerras
dançam ao som abafado dos tambores,
enquanto clama por coragem esse temor nativo
da branca paz contraída pelos mortos.

Novamente a necessidade brutal lava as mãos
no guardanapo de uma causa suja, novamente
desperdiça-se nossa compaixão, como na Espanha,
o gorila se bate com o super-homem.
Envenenado pelo sangue de ambos,
o que me restará, dividido ao meio?
Eu que xinguei
o oficial embriagado pela lei britânica, como escolher
entre esta África e a língua inglesa que amo?
Trair os dois, ou dar a eles o que me dão?
Como encarar essa mortandade e manter-me lúcido?
Como dar as costas à África e viver?

Derek Walcott (1930–2017), Prêmio Nobel de Literatura, 1992
Tradução: Thereza Christina Rocque da Motta




sábado, 16 de janeiro de 2010

Anne Morrow Lindbergh (1906-2001)

SECOND SOWING
Anne Morrow Lindbergh

For whom
The milk ungiven in the breast
When the child is gone?

For whom
The love locked up in the heart
That is left alone?

That golden yield
Split sod once, overflowed an August field,
Threshed out in pain upon September’s floor,
Now hoarded high in barns, a sterile store.

Break down the bolted door;
Rip open, spread and pour
The grain upon the barren ground
Wherever crack in clod is found.

There is no harvest for the heart alone;
The seed of love must be
Eternally
Resown.


SEGUNDO PLANTIO
Anne Morrow Lindbergh

A quem
dar o leite que ficou no peito
depois que o filho se foi?

A quem dar
o amor que ficou no coração
abandonado?

A porta dourada
que se abriu para um imenso prado em agosto
e tombou de dor em setembro,
agora guarda, nos celeiros, uma safra estéril.

Quebrem a tranca da porta,
rasguem as sacas, espalhem e derramem
os grãos
sobre os poros da terra.

Não há colheita para o coração que está só:
a semente do amor precisa ser
eternamente
replantada.

in "O Unicórnio e outros poemas", a sair
Tradução: Thereza Christina Rocque da Motta